domingo, 10 de outubro de 2010


Estava muito frio e chovia forte lá fora, ela olhou pela janela e uma grossa camada de neblina pairava perto do chão. As únicas coisas visiveis do lado de fora estavam sendo iluminadas por postes de iluminação. Ela pensava nele, como fazia todas as noites, principalmente nas noites de frio. Tinha memórias com ele que não eram reais, a iludia, mas gostava disso, se auto iludir soava melhor do que ser enganada por alguém que ela amava. Tinha medo, mas tinha mais medo ainda de passar todas aquelas noites de frio sozinha, encolhida sob um cobertor, que no momento fazia a vez dos abraços dele, abraços que tanto desejava naquela noite. Ouviu um barulho em sua janela, como se tivessem atirado pedrinhas, em ritimo constante e musical. Ela se contraiu na cama com o susto, depois rechonheceu a música. Se levantou com medo e ficou próxima da janela, de pé. Depois, quando a música deveria terminar, as pedrinhas sessaram e então foi até o beiral da janela, e a abriu. Estava chovendo muito forte lá fora, e devido a neblina não enchergava com nitidez. Tinha uma pessoa sentada, de cabeça baixa, em um banco de pedra, que havia em frente a sua janela. Quando a pessoa a viu, acenou, pedindo para ela ir até lá fora. Desceu as escadas correndo e pegou o guarda-chuva que estava atrás da porta. Abriu a porta e ficou esperando por alguma reação ali mesmo, com a porta aberta, não houve nenhum movimento, teve medo. Virou, estava entrando quando algo puxou seu braço, ousou gritar, mas logo ele a abraçou, sentiu-se confortável e segura como não me sentia há anos.

- Você veio - ela disse espantada, mas com o olhar mais calmo e feliz do mundo.

- Eu te esperei o dia inteiro aqui, naquele banco - disse ele sem a soltar.

- Eu te esperei a minha vida inteira.

- Desculpe-me a demora, não pude vir antes - disse por fim a soltando, mas segurou em seus ombros com firmeza esperando pelo perdão.

- Não tem à que perdoar, você não me prometeu nada.

- Eu te prometi vir, eu vim.

- Então não tem do que te desculpar, você veio.

- Sim, ainda preciso do seu perdão, mas não por me atrasar.

- Precisa dele por que então? - ela já estava confusa e não sabia do que ele estava falando.

- Te prometi dar a minha vida, e cumprirei a promessa, mas antes deixa eu passar essa noite aqui, com você, te conhecer, deixa eu ficar uma única noite com você, para eu nunca mais esquecer como é bom olhar nos teus olhos e te abraçar.

- Eu ainda não entendi, você quer isso por que? Você vai me deixar de novo? - já com lágrimas nos olhos só de pensar em perdê-lo, ela baixou a cabeça.

Ele levantou a cabeça dela tão delicadamente e passou a mão em seu rosto. Acenou com a cabeça pedindo para entrar.

Eles entraram e foram ao quarto dela, já eram duas da manhã e ela teria que sair no outro dia, bem cedo. Ela disse isso a ele e perguntou se ele não poderia vir na noite seguinte, mas ele, com muito pesar, disse que teria um compromisso, uma tarefa a cumprir.

Ele ficou abraçado com ela, passando os dedos em seu cabelo até ela adormecer. Ficou olhando-a sorrir, com certeza com o sonho que estava tendo.

Olhou no relógio que estava em cima de seu criado-mudo, já eram seis da amanhã e daqui a uma hora ela iria acordar. Então ele foi até sua escrivaninha e escreveu uma carta endereçada à ela, deu um beijo e pôs uma rosa em sua cama, pegou seu casaco e foi embora.

Ao acordar ela viu que ele não estava mais lá, seu coração começou a doer, a sensação de estar sozinha novamente surgiu. Ela viu a carta que ele deixou em cima da escrivaninha para ela, pegou-a e foi ler em sua cama, segurando a rosa que ele tinha deixado para ela.

” Valeu tanto à pena ter me atrasado a sua vida toda para te conhecer, valeu à pena ter esperado um dia inteiro e mais algumas horas de baixo da chuva só para tilintar as pedrinhas da sua música preferida na sua janela. Eu sei que não te conhecia, mas de certa forma, parecia que você tinha nascido para ser minha alma gemea. Eu te imploro que me perdoe por isso, eu te disse, mesmo você sem entender. Disse que te daria minha vida, e vou te dar hoje, quando souber vai entender o porque, mas peço que não fique triste, brava e nem se culpe por isso, eu fiz isso porque sou muito egoísta e não me imaginaria em um mundo onde você não existisse, e fiz isso porque te amo, mais do que minha própria vida.”

Ela começou a chorar desesperadamente, mas ainda não tinha entendido, ele era tudo o que ela sempre esperou.

Ela se arrumou e saiu, tinha que ir para o seu estágio de advocacia, e hoje iria na delegacia resolver algumas coisas.

Chegou um homem preso, foi direto para a sala de interrogatório, ela iria ficar vendo esse interrogatório. Deu uma rápida lida na ficha do detento e ouviu todo o interrogatório.

- Eu sou apenas um pau mandado, matador de aluguel. Me mandaram matar uma menina, mas depois, em cima da hora, falaram que era pra matar esse cara, disse alguma coisa sobre: ” ele deu a vida por ela, mas se a menina cruzar o meu caminho de novo ela também roda”, mas parece que esse cara descobriu coisas a mais que a menina só para morrer no lugar dela. Ela é uma garota de sorte, ele foi muito corajoso.

Ela ficou pensando na frase que o detento havia dito, ele deu a vida por ela. No final do interrogatório ela foi até a sala do delegado conversar com ele.

- Esse caso foi até fácil, mas fiquei impressionado, a coragem do morto foi muita, ele devia realmente amá-la.

- É mesmo, mas afinal quem é esse, o cara que morreu?

- Ah, por sua sorte eu tenho uma foto dele aqui, apreendemos no escritório do cara, uma foto do morto e uma da menina que deveria morrer, mas não vi a da menina nem do cara.

Quando o delegado entregou o envelope com as fotos na mão dela, ela se sentiu muito mal, uma dor corrosiva invadiu o seu peito e ela empalideceu. Quando abriu e viu que ela era a menina e o cara era o homem perfeito que ela tinha esperado a vida inteira, começou a chorar, porque agora ela tinha entendido a sua carta.

Ela foi para casa deitou em sua cama sob o cobertor, encolhida, como em todas as noites, que no momento fazia a vez dos abraços dele, tão desejados naquela noite, só que justo naquela noite não fazia frio e as memórias dela eram tão reais como aquela rosa que mesmo depois de meses continuava com a mesma aparencia, sustentada por toda a felicidade e amor que ele deu para ela.